Café Bagdad

À conquista das palavras...

Name:
Location: sintra, Portugal

I was born in Mozambique. I'm Portuguese, but my heart is half Portuguese, half African. I'm still thinking that one day we can change the world.

Monday, March 26, 2007

Aventura em Salzburg - O comboio da Felicidade

Há algumas semanas atrás, estava a escrever ao meu primo Alfredo Manuel, quando me lembrei de uma história curiosa, uma verdadeira aventura, ocorrida em Abril de 2000. Prometi que a contaria aqui.

Regressávamos de uma visita memorável a Salzburg, cansados mas felizes, num comboio com destino a Viena, onde nos encontrávamos de férias. Na nossa carruagem seguiam apenas austríacos, polidos, circunspectos, educadamente alheios ao que os rodeava.

Cada um lia o seu jornal, semicerrava os olhos ou fingia dormir. Os típicos chapéus tiroleses, comprados frente à casa de Mozart, devido à chuva miudinha que caía quando por lá deambulávamos, identificava-nos como turistas.

À minha frente seguia um bonito homem com cerca de 70 anos. Dormitei, acordei, sorri-lhe, ele retribuíu-me o sorriso, e a viagem continuou. O meu marido e a Carolina iam dormitando e acordando, até que comecei a brincar com eles, para verem melhor a paisagem, imperdível.

O austríaco, curioso perante a nossa língua, perguntou-me se falava inglês, respondi que sim, se éramos espanhóis, respondi que não, e fiz a apologia da nossa pátria bem amada, com o calor que me é habitual. Dizer mal de Portugal, só para consumo interno, lá fora, somos o melhor país do mundo...

A conversa continuou, ficámos a saber que era um médico reformado, vivia junto à última estação antes de Viena, mas era de Salzbirg, onde ia sempre que podia, para se embriagar com a beleza da sua terra. Andava a aprender espanhol, pois iria de férias para Espanha, ainda nesse Verão.

Falava muito bem inglês, facilitando a conversa e descrição de hábitos e costumes, até chegámos à conclusão que nos parecíamos bastante - eles ainda sentem um certo arrepio pela ocupação alemã, muito parecido ao que sentimos pelos espanhóis...

Quando nos perguntou se conhecíamos bem Salzburg, respondi-lhe que apenas como turistas, mas que tínhamos adorado e queríamos voltar. Insistiu que voltássemos por duas semanas, tempo mínimo para passarmos a gostar ainda mais da sua terra. Quis explicar-nos o que era o "edelweiss" que cobre as montanhas, aí, comentei-lhe que tinha passado uma parte da infância a cantar uma canção com esse nome. Surpreendido, respondeu-me que a desconhecia, voltei à carga, falando do filme "Música no Coração" - quem, da minha geração, não recorda todas aquelas melodias?

Perante o seu desconhecimento, achei por bem dizer-lhe que era a história da Família Von Trapp. Inútil, nunca tinha ouvido falar de tal filme. Quase desesperada, comecei a trautear a canção "Edelweiss", ganhei fôlego, entusiasmei-me e, qual filme musical, cantei o reportório que tinha alegrado a minha infância.

Enquanto cantava, chapelinho de plumas a abanar, marido e filha, a pediam-me para parar, entredentes, embaraçados com o espectáculo. Mas eu sentia-me tão feliz, parecia ter de novo 11 anos, continuava a cantar. Na carruagem, todos tinham parado a leitura ou o "finge que dorme para não ter de falar com o parceiro da frente", e todos seguiam, entusiasmados, os meus trinados, acenando e batendo com os pés.

Quando dei por mim, parei, sob aplausos, dos incrédulos viajantes. Levantei-me, sorridente, e agradeci. Ainda hoje devem interrogar-se sobre quem seria a "cantora"...

Quanto ao nosso companheiro de viagem, antes de sair, apertou-me a mão, agradecendo a melhor viagem da sua vida. Estava a pensar mudar as férias de Espanha para Portugal, porque nunca tinha visto estrangeiros tão simpáticos, que, ainda por cima, cantavam nos transportes públicos, coisa absolutamente fantástica para ele.

Se ele veio a Portugal, qual terá sido a sua reacção, ao viajar nos nossos transportes públicos e não ver ninguém a cantar?...Nem quero pensar na tristeza da maioria...

Ao descerem, todos os passageiros nos cumprimentavam, exactamente os mesmos que antes pareciam frios e distantes.

Com a nossa alegria de viver, uma viagem monótona e banal veio a tornar-se numa história divertida e inesquecível. A barreira da língua e a diferença de mentalidades ficou mais ténue.

Tenho a esperança de que, quando lhes falem de Portugal, todos aqueles passageiros se lembrem de nós com um sorriso.

Naquele ano de 2000, se bem me recordo, tinha havido aquela polémica daquele político austríaco de extrema direita, Heider, que tinha falado dos povos do sul como "aqueles preguiçosos". Estávamos em ambiente de cortar à faca, mas bastou o comboio da felcidade para nos unir. Se isto não é um exemplo de como conseguirmos sentir-nos europeus, não sei, francamente, como lá chegar.

Mais um poema do Joaquín Ramirez Garrido

Estaciones ( Primavera )

Sueño tu rostro de invierno,
en este Hotel ajado,
donde pago la cama
y el alquiler de los recuerdos.
Cómplices los visillos de la habitación,
bailan al son del viento
y la memoria de esta falsa Primavera.
Suenan canciones de Battiato,
en el bar repleto de cuadros de Blake,
negra cerveza presta a la boca,
tus manos con señales de la edad,
acariciaban el cristal
mientras te mirabas en mi rostro.
La distancia, ser ajeno al mundo
desde este cuarto alquilado,
fría ginebra en la boca,
sonidos tan lejanos del instante,
todo tan fuera de mi vida,
recuerdan tu recuerdo.
Nos encontró el destino
en el ágape de un deceso,
me miraste y me asustó
la envergadura de tu fijarte.
Tenías algo de bailarina de tangos loca,
y yo,
que amo los ritmos enchulados,
las miradas con futuro de cama revuelta,
las pasiones desaliñadas,
con desencuentros profundos
y desastres para recordar,
obligado por el rigor de los nombres,
te puse,
ajeno al murmullo del bar,
por nombre Abraxas.
Pensé que al fin todas las mujeres
convergen en diosas,
y tú tenías ojos de Cábala,
mirar de ardiente Sefirot,
Arcana de los números.
Apenas cruzamos palabras aquella noche,
luego todos los diálogos se fueron trabando,
como los fantasmas de las vigilias de alcohol.
Las citas, tus nervios y mis depresiones,
el malentendido de nuestras vidas,
algún insulto hiriente arrojó tu boca,
con la fineza de las balas de plata,
hermosas, perfumadas, mortales.
La distancia, y su perspectiva te recuerdan,
mientras lleno el vaso con la última ginebra,
con la que brindaré por la despedida
de un amor de plástico.

O Joaquín continua com a inspiração em ponto alto, agora ainda mais reforçada pela chegada da Primavera.

Tuesday, March 20, 2007

POEMA DO MEU AMIGO JOAQUÍN RAMIREZ GARRIDO

Le Diré

Le diré, seré sincero
Que la copa llena ocupa toda la vida
Que me perdí en laberintos
Sin hilo de Ariadna
Apuro la misericordia de los Gin Tonics
En el bullicioso silencio de los bares
Guardo escrupulosamente los cigarros Ducados
Con el orden que solo el obsesivo lo sabe hacer
No renovaré la chaqueta de Ante
Que he regalado el libro La Fuente de la Vida de Ibn Gabirol
Y la primera edición de El Hacedor del padre Borges
Le diré, no me avergüenza
Reconocer que soy menos resistente que el resto

O Joaquín é El Aviador Capotado, um verdadeiro poeta, com quem se aprende todos os dias.Já temos combinada uma tertúlia cá em casa, com muita poesia e música.